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O Transtorno do Colapso das Colméias

Artigos Técnicos - Geral

Transtorno do Colapso das Colméias

Eduardo Allgayer Osorio¹

¹ Professor Titular da Universidade Federal de Pelotas, aposentado

Denomina-se Transtorno do Colapso das Colméias (CCD, do inglês Colony Collapse Disorder) à síndrome caracterizada pela perda das colméias por abandono súbito das abelhas.

A partir de 2006, apicultores dos EUA e da Europa passaram a relatar perdas de 30 a 90% de suas colméias¹, com sintomas inconsistentes com os que usualmente ocasionam a morte das abelhas. Contrariando um forte espírito de coesão social, típico da espécie, as abelhas subitamente empreendem um vôo desordenado, deixando desprotegida a colméia, suas crias, a rainha e uma boa provisão de mel e pólen, restando na colméia poucas ou nenhuma abelha morta (quando a colméia colapsa por outras causas – doenças, parasitas ou produtos químicos nocivos – é comum encontrar um grande número de abelhas mortas dentro e no entorno da colméia).

No intuito de avaliar o volume do dano decorrente da ocorrência do CCC, levantamentos² realizados pelo Agricultural Research Service (ARS), do Departamento de Agricultura dos EUA, indicam perdas de cerca de um terço das colméias a cada ano.

Desde então, inúmeras teorias sobre as causas do CCD vem emergindo, tão célere quanto a velocidade de desaparecimento das abelhas. Segundo o ARS², “embora muitas causas possíveis tenham sido propostas, relatadas e discutidas – tanto na literatura científica quanto na mídia popular – nenhuma causa foi comprovada”, concluindo que “existem boas e más notícias; a boa notícia é que a taxa de perda das colméias está estabilizada, ao invés de continuar crescendo; a má notícia é que a causa, ou causas do CCD, permanecem obscuras”.

Dentre as inúmeras causas aventadas como promotoras do CCD, as mais frequentemente listadas são:

  • Parasitas

O exame de colméias CCD mostra, na maioria das vezes, vestígios de Varroa destructor, um ácaro altamente agressivo que suga a hemolinfa das abelhas, ataca suas larvas e afeta a qualidade reprodutiva da rainha, danos que se somam ao prejuízo de transmitir doenças viróticas de alta agressividade.

  • Patógenos

Diversos estudos apontam o fungo Nosema ceranae como uma das causas do CCD. Embora muito agressivo, com potencial para causar perdas significativas às colméias, esse patógeno tem sido encontrado tanto em colônias afetadas por CCD como nas demais, reforçando o ceticismo em aceitá-lo como uma causa exclusiva de CCD, sem prejuízo a atuar como fator coadjuvante, associado às viroses ou a outros fatores deletérios, circunstância em que pode elevar a letalidade na colméia a 100%.

Um aspecto também sugerido² refere-se à possibilidade de que novos patógenos, ainda não identificados, possam constituir-se em agentes responsáveis pelo CCD.

  • Estresse por migração das colméias

Dentre os fatores nocivos às abelhas destaca-se o estresse gerado pelo deslocamento das colméias por longas distâncias, várias vezes ao ano, comum na apicultura migratória. Sendo a capacidade de orientação vital para as abelhas, a frequente realocação das colméias pode estressá-las ao ponto de prejudicar-lhes o sentido de direção, além de dispersar patógenos e parasitas para novos ambientes, contribuindo para a ocorrência do CCD, embora inexista, até a presente data, suficiente comprovação científica a respeito². Confinadas em suas colméias enquanto transportadas, as abelhas recebem suplementos energéticos e protéicos relativamente pobres, destituídos da ampla gama de nutrientes normalmente encontrados no néctar e no pólen das plantas.

  • Nutrição

Estudos revelam que abelhas que buscam alimento em plantas de variadas espécies usufruem um sistema imune mais saudável do que aquelas que se nutrem do pólen/néctar de uma única espécie ou de uma reduzida variedade de plantas, levando à crença de que o CCD possa estar ligado à perda da diversidade das plantas disponíveis às abelhas. No que respeita à diversidade das abelhas, existem suspeitas de que a seleção orientada para melhorar-lhes o desempenho na polinização de cultivos comerciais promova uma redução na diversidade genética desses insetos, com os prejuízos consequentes.

A combinação de diversos fatores, como a escassez de pólen/néctar, a falta de diversidade do pólen/néctar disponíveis, o acesso limitado à água (ou o acesso a águas contaminadas), ocasionados pela redução dos ambientes naturais em função do avanço de culturas comerciais não melíferas, pode estar enfraquecendo o sistema imunológico das abelhas, tornando-as mais suscetíveis aos patógenos e parasitas, oportunizando a ocorrência do CCD.

A escassez de pólen/néctar em determinadas épocas do ano (no inverno principalmente) leva à recomendação de proceder a uma suplementação nutricional energética (xarope) e protéica (proteína de soja) nesses períodos. Estudos conduzidos apontam os suplementos energéticos feitos á base de frutose de milho (HFCS) como possíveis causas do CCD. Contudo, vários relatos da ocorrência de CCD têm sido feitos em apiários onde não foi usada a suplementação com xarope HFCS, pondo em dúvida a hipótese formulada².

  • Pesticidas

Pesquisa conduzida pelo Departamento de Agricultura dos EUA, em conjunto com Universidades norte americanas², analisando a presença de 121 diferentes pesticidas e seus metabólitos em amostras de cera, de pólen e de abelhas colhidas nas colméias, concluiu que embora em 60% das amostras analisadas tenha sido constatada a presença de pelo menos um pesticida sistêmico, na maioria delas o nível encontrado era inferior ao considerado letal às abelhas. Segundo a Agência de Proteção Ambiental Norte Americana (EPA)³ “até a presente data não foi encontrado qualquer dado demonstrando que os pesticidas registrados na EPA, usados conforme as instruções contidas no rótulo, tenham causado CCD”.

Em meados da década de 1990 foram lançados os pesticidas neonicotinóides (clothianidin, thiamethoxan, imidacloprid e outros), por evidenciarem menor toxicidade à vida selvagem, às pessoas e inclusive às abelhas¹. Por sua ação sistêmica esses produtos deslocam-se com a seiva na planta, atingindo o pólen e o néctar, circunstância que levou alguns ambientalistas a apontá-los como causa do CCD. Em pesquisas conduzidas constatou-se que, aplicados nas doses recomendadas, os resíduos de neonicotinóides medidos no pólen e no néctar não atingem níveis passíveis de causar a súbita mortandade das abelhas. Contra argumentam alguns que a exposição crônica (baixa concentração por longo tempo) poderia prejudicar a capacidade de navegação e de alimentação das abelhas. A polêmica suscitada tornou-se intensa, esbarrando na constatação de que em países, como a Alemanha, a França e a Itália, onde o uso de neonicotinóides foi banido, o problema do CCD mantem-se com igual intensidade².

  • OGM

Suspeitas vem sendo levantadas de que os cultivos geneticamente modificados (OGM), especialmente o milho Bt (alterado para produzir a toxina Bacillus thuringiensis, nociva aos insetos), possa estar ocasionando o CCD. Essas afirmativas conflitam com os fatos do milho Bt ser largamente plantado desde a década de 1990, manifestando-se os eventos de CCD somente a partir de 2006 e de que em países onde foi proibido o uso de milho Bt continuar ocorrendo o CCD².

  • Ondas da telefonia celular

Segundo alguns¹, as ondas da telefonia celular irradiadas pelas torres de transmissão estariam interferindo na capacidade de navegação das abelhas, contribuindo para o CCD, carecendo de comprovação esta afirmativa já que o colapso das colméias tem sido constatado, tanto perto quanto distante dos locais de irradiação².

Diante de tamanha polêmica e da insuficiente comprovação científica sobre cada uma das causas apontadas para a ocorrência do CCD, torna-se consensual no meio científico a idéia de que esse fenômeno seja causado por fatores múltiplos atuando em combinação ou de forma sinérgica, não sendo ainda possível afirmar exatamente quais sejam eles, se o mesmo conjunto de fatores está atuando em todas as ocorrências ou se eles agem numa mesma sequência em todos os casos.

Relatório recente do Departamento de Agricultura dos EUA sobre as causas do CCD concluiu que “das 61 variáveis quantificadas, não foi encontrada comprovação consistente de que um único fator possa ser apontado como agente causal. As abelhas das colônias CCD mostram infestação por um número de patógenos superior e em níveis mais elevados do que as populações controle”, afirmando que “a combinação de estressores ambientais pode estar desencadeando uma cascata de eventos e contribuindo para a formação de colônias onde as operárias tornam-se mais enfraquecidas e mais suscetíveis a pestes e patógenos”, concluindo: “provavelmente nenhum fator sozinho é responsável pelo CCD”.

  • Bibliografia citada

¹ Honey Bees Colony and Collapse Disorder (CCD). USDA. Agricultural Research Service. 2012. http://www.ars.usda.gov/News/docs.htm?docid=15572

² Colony Collapse Disorder: An Incomplete Puzzle. USDA. Agricultural Research Service. 2012. http://www.ars.usda.gov/is/AR/archive/jul12/colony0712.htm

³ Pesticide issues in the works: honeybee colony collapse disorder. U. S. Environmental Protection Agency. 2012. http://www.epa.gov/opp00001/about/intheworks/honeybee.htm
 
 

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